quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

CHAPLIN – uma vida - O eterno “Adorável Vagabundo”...

TRANSCRIÇÃO: LUIZ DOMINGOS DE LUNA
Ele fez viagem de 19 quilômetros até o orfanato em um carro de padaria puxado a cavalos. Sacudindo e dando solavancos por estradas ladeadas de castanheira, passando por pomares e campos de trigos, a carroça cruzou o perfumado e verde interior inglês.

Para o garoto de 7 anos, era um sopro de ar fresco comparado com as lúgubres ruas cinzentas e o denso nevoeiro enfumaçado dos sufocantes pardieiros do sul de Londres de onde tinha saído. Até, claro, ser recebido pela primeira das duras exigências da vida.

O Menino Charles logo se tornou mais um triste grupo de 35 jovens reprovados que tiveram o estigma de cabeça raspada e tingidas de iodo na mais triste quarentena naquele ano. Vasculhando as películas de celulóide, não é difícil captar o cheiro de sua infância. Claro que é possível especular sobre os detalhes exatos.

A Carroça da padaria da escola Hanwell era fechada como a que levou a jovem que acabara de ficar órfã em tempos Modernos ? Ou era aberta como aquela na qual a criança abandonada foi mandada para o orfanato em O Garoto ?

E as tristes lembranças de orfanato de Chaplin tendo a cabeça raspada não eram a fonte de sua eterna preocupação com aquela maravilhosa cena do circo de pulgas que se inseriu no retorno do palhaço Calvero em Luzes da Ribalta ?
As trocas de Calvero entre um vagabundo picado por pulgas se coçando constrangido e o treinador de insetos acrobatas orgulhosamente exibindo seu corpo de baile são executados com brilhantismo cômico.

Mas dizer que Chaplin controlou seu velho terror do orfanato de se descobrir infestado de pulgas transformando isto em uma divertida peça exibicionista não serve muito para a nossa compreensão do funcionamento do processo criativo.

Uma explicação tão crua depende inteiramente do primado de Freud sobre a psicologia das piadas para explicar os mecanismos sutis da comédia. Ele pressupõe que a mente cômica funciona como um caldeirão do Id automaticamente transformando medos infantis em brincadeiras escolares que são periodicamente cuspidas das profundezas borbulhantes do inconsciente.

Como , Dickens, que era assombrado por seu encontro ainda menino com a caixa de engraxate e a prisão dos pais por causa de dívidas, Charles Chaplin nunca se esqueceu do trágico mergulho de sua família na pobreza e dos momentos brutais de sua infância.

Ele os relembrou repetidamente na sua persona imortal do adorável Vagabundo. Não só o personagem de Charles reviveu e algumas vezes triunfou sobre seus problemas de infância, como em certos momentos seu vagabundo também pareceu determinado a corrigir a situação difícil dos pais, embora em clima de pastelão.

A despeito de sua aparência fraca e ineficaz, o vagabundo – herói cambaleante e desajeitado de Charles tem uma determinação férrea de salvar jovens suplicantes assolados por pobreza, desemprego, solidão, internação, doenças físicas incuráveis, prostituição, bebês roubados e outros terríveis apuros. E quando embriagado, como esteve em pelo menos doze filmagens diferentes, o Adorável Vagabundo de Chaplin abre seu caminho trôpego por uma pista de obstáculos repleta de braços letais e quedas cômicas concebidas para destruir qualquer um menos o alcoólatra mais ágil.

Com milagres coreográficos inventados por seu criador, os bêbados de Chaplin são sempre vigiados e afastados do perigo por seus anjos da guarda. Em seu fade- out mais memorável, o Adorável Vagabundo deixa a cena em direção ao pôr do sol, desolado e só.Os mais importantes sobre os retratos nostálgicos criados por Chaplin de sua família e do sofrimento solitário de sua infância nessas cenas é o tom agridoce de sua visão cômica e o modo marcantemente magnânimo pelo qual ele festeja seus pais displicentes.

Mas Chaplin não foi apenas grande: ele foi gigantesco. Em um mundo arruinado pela guerra, ele trouxe o som do riso e o alívio para tantas pessoas que necessitavam de alento durante períodos tão dilacerante como a Primeira Guerra Mundial e a grande Depressão. Ao apresentar uma investigação sobre a trajetória de Chaplin e as fontes de sua genialidade, Stephen Weissman explica , de maneira detalhada e fascinante, como a infância trágica formou a personalidade e a arte daquele que é considerado um gênio atemporal.

Referência: Sobre  o autor: STEPHEN WEISSMAN, Psiquiatra de formação, pesquisou a vida de Chaplin durante anos e estudou todos os documentos que o levaram a conhecer profundamente o grande mestre da Sétima Arte. Autor de diversos livros de psiquiatria é professor da Washington School of Psychiatry e mora em Washington, D.C

Matéria Transcrita da coluna: Momento do Livro – Conteúdo publicitário – Chaplin Uma vida O eterno “ Adorável Vagabundo”... Ciência & Vida filosofia Ano VI. Nº 66. Janeiro 2012. Esta revista é uma publicação da Araguaia indústria Gráfica e Editora LTDA. Produzida sob encomenda para a editora Escala.

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